sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

REGISTRO DOIS: roteiro

Este registro diz respeito ao item Roteiro Cinematográfico,
tendo a trajetória e referência o meu primeiro trabalho em audiovisual
O Forasteiro - http://curtaoforasteiro.blogspot.com.


Enfatizando novamente: fiz uma adaptação de um conto literário de minha autoria para a realização deste filme, embora não dominando as regras, estrutura e nomenclaturas inerentes a esse tipo de texto, adaptei o conto para um tipo de roteiro que eu entendia... escrevi de forma intuitiva, bastante distante do que seria de fato um texto de roteiro cinematográfico.

Filmamos tudo em julho de 2010 e primeira semana de agosto do mesmo ano, e ao longo do período da pós-produção (já em 2011) fui-me acercando mais sobre a estrutura de roteiro para cinema. O que me ajudou muito mesmo foi participar e ficar em segundo lugar entre os cinco melhores roteiros escolhidos no I Edital Ideal de Curta-metragem 2010. Para inscrever meu roteiro eu tive de me aprofundar mais sobre essa estrutura textual especifica (pesquisei alguns na internet e li algo sobre); e mais a frente, ainda como consequência da participação deste edital onde os cinco colocados tiveram uma oficina de roteiro com o cineasta Roger Elarrat. Dali em diante e depois em conversas com outros cineastas mais experientes, pude compreender de fato, essa estrutura de roteiro para cinema e também suas peculiaridades na forma da escrita.

Compreendi que contar uma história, todo mundo sabe fazer... mas contar uma história utilizando o recurso do cinema, exige uma certa ressignificação! E qual o motivo disso? Porque contar uma história no cinema é organizar REGISTROS do que o protagonista da história faz de importante e significativo para dar “interesse” à trama. Esse registro é feito através dos recursos que dispõem a linguagem cinematográfica. E utilizar esses recortes é direcionar a atenção e o olhar do expectador para as peças mais importante para se compreender a história.

Deve-se entender que o roteirista depende, no mínimo, do olhar bem aguçado e sua atenção bem refinada e definida para o objetivo de contar sua história bem contada, organizando as partes relevantes dessa narrativa! O escritor deve conhecer esses artifícios quando escreve suas ideias para roteiro de cinema, pois esse roteiro é mais VISUAL do que propriamente narrativo e literário. A trama é contada visualmente, entretanto, os elementos pesam entre esconder e mostrar a ação dos acontecimentos, pois o interessante é prender a atenção do espectador através de sua própria imaginação.

Se percebermos, quando alguém nos narra um acontecimento, isso acontece através de CORTES e de SEQUENCIAS dentro dessa narração. Ora, há de se observar que quem conta os fatos de uma história qualquer (verídica ou não) o faz de maneira que prenda a atenção do interlocutor. E como fazer para prendemos a atenção de quem nos escuta contar uma história?

Ao arrumar os fatos que compõem a ideia esbravejada pelo roteiro, o escritor deve fazer de acordo com a linguagem, nomenclaturas e termos apropriados para esse tipo de texto, que devemos compreender tratar-se de um “texto grávido”, (tal qual chamamos para o texto dramatúrgico para o teatro). A ideia que está registrada nesses tipos de textos literários ainda não é a materialização da obra artística para os respectivos suportes, (ao que tratamos aqui: o suporte é o cinema). Em analogia, compreender o filme como “a criança” que nasce desse texto gravido, que é o roteiro.

Logo, contar a história através do texto de roteiro cinematográfico é antes de tudo, VER o filme imaginando as cenas. O grande motivador da ação é o conflito. O surgimento do conflito retira o personagem de seu cotidiano e o leva a agir, se movimentar para resolver o conflito gerado.

O roteiro cinematográfico é escrito para ser contado através de imagens em movimento (ou seja, ações filmadas). A ação deve ser “visualizada” por quem lê o roteiro (lembrando que esse tipo de texto interessa primeiramente ao Diretor e sua equipe, e não ao leitor comum).

Existem outras peculiaridades da forma, semântica e também da estrutura textual que obviamente não colocarei aqui! Sempre gostei do tipo de aprendizagem onde nos dão as ferramentas para pescar e não nos dão o peixe diretamente nas mãos... pensar e refletir são excelentes exercícios, ao meu ver, e é aqui que se separam o joio do trigo! O bom roteirista deve esforçar-se para compreender por si mesmo a ferramenta que deseja utilizar, pois cada entendimento é único e varia de individuo para individuo, além é claro que a linguagem do audiovisual é sem sombra de duvidas, a mais misteriosa e subjetiva de todos os suportes artísticos, a sua utilização pede muito ao criador/realizador, que deve estudar, ler, observar bastante não apenas sobre cinema mas sobre a vida e tudo que nela acontece. O bom Cineasta deve ser uma super-antena...


Katiuscia de Sá
29 de dezembro de 2011.


# REGISTRO UM: direção

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

O DRAGÃO DA MALDADE CONTRA O SANTO GUERREIRO


A espetacularização, fatalismo e perpetuação tradicionalista à flor da pele. O diretor Glauber Rocha apropria-se de elementos inerentes à cultura nordestina para mostrar as desigualdades sociais do País. Ícones tradicionais são distribuídos ora em prosa, ora em verso, num movimento aparentemente desordenado. O filme dispensa muitas falas. A narrativa desliza através de imagens, ações, danças e músicas, o que possibilita a leitura dos significados imagéticos.

Um cangaceiro se auto-intitula reencarnação de Lampião – o rei do cangaço. Aparece ele trajado a caráter, como nos bandos de outrora, porém, sua força de luta está contida na ritualística cultural dos costumes nordestinos. O “duelo” é o repente (conhecido também como “desafio”, é uma tradição folclórica brasileira cuja origem remonta aos trovadores medievais, que no nordeste acontece sob forma de cantoria rimada e improvisada); o coro de beatas faz pano de fundo através de cantorias e lamentos festivos, típicos da região da seca. A miséria, a fome, dominação ideológica dos “coronéis”, tudo influencia para a “domesticação” do homem do campo.

O DRAGÃO DA MALDADE CONTRA O SANTO GUERREIRO arrebatou no ano de 1969 as premiações de Melhor Direção no Festival de Cannes; Melhor Direção segundo a Confederação Internacional de Cinema de Arte e Ensaio; Primeiro Prêmio do Festival de Louvaing (Bélgica); Prêmio do Público – Menção Honrosa Especial, na Semana Internacional de Cinema de Autor (Espanha). Este filme foi a continuidade do DEUS E O DIABO NA TERRA DO SOL, no qual o personagem Antônio das Mortes já transitava.

Uma das inovações do filme foi a sacada de Glauber em apropriar-se dos ícones tradicionais e colocá-los como atores sociais fora do contexto da teatralização cotidiana. A ritualística das ações das personagens centrais está disposta fora das situações nas quais normalmente ocorrem essas dramatizações sociais. Por exemplo, a luta entre Antônio das Mortes e Corisco – cangaceiro reencarnação de Lampião obedece às aparências de festejos populares, embora na narrativa do filme não se trate de festejo ou dramatização social, seria algo real dentro de um contexto real.

Tal recurso oferece ao filme um tom “teatralesco”, no qual é possível mostrar ao público espectador toda opressão, grau de alienação e subjugação que se encontram as classes menos abastadas do Sertão nordestino; além da insanidade generalizada e busca por um ponto de fuga cujos personagens procuram desesperadamente, para poderem suportar àquela realidade sem perspectivas que o filme retrata.

Outro aspecto interessante é o jogo de imagens e insinuações que Glauber Rocha se utiliza para mostrar poeticamente que mesmo, em meio ao caos, o ser humano recorre à Arte como subterfúgio de expressão e assimilação do cotidiano, mostrando esse diálogo como algo possível de ser belo.

O filme todo brinca com esse tom “espetacular”, no qual o cidadão comum torna-se um “super-herói” apoiado nos próprios mitos de sua cultura. A dialética contida nos poucos diálogos também contribui para a interpretação da mensagem. Ângulos plongè e closes colaboram para mostrar o desamparo social (e de loucura) que as personagens mergulham em si mesmas.

A interpretação dos atores está condizente com a proposta do filme. Um professor bêbado e desesperançoso; um matador arrependido e sem rumo, um delegado corrupto e covarde; beatas em transe; um padre sem voz e força de expressão; um cangaceiro com aspectos mitológicos; um latifundiário raivoso, (porém cego); e sua esposa – uma mulher submissa que mais tarde, acionada pela desgraça dos acontecimentos, toma iniciativa de matar o delegado amante… na cidade de Jardim das Piranhas, morte em massa!

Glauber Rocha incorpora ainda valores do sincretismo religioso, invocando São Jorge Guerreiro – Santo protetor da Inglaterra, que em terras brasilis é a configuração de “Ogum”; daí recorre o nome do filme, que é sem dúvida uma aula de semiótica, de valores sociais, tradicionalismos e antropologia cultural.

Katiuscia de Sá
11 de Fevereiro de 2009.


Diário de Bordo – EVA FAZ DE CONTA


*com saudades para “titio” Walter, que virou purpurina...

REGISTRO de meu trabalho de laboratório como preparadora de elenco para a minissérie em três capítulos “EVA FAZ DE CONTA”, totalmente rodado em Belém do Pará, no período de 01 a 15 de julho de 2010, projeto realizado pelo Núcleo de Produção Digital Belém (NPD-PA) – integrante do Programa Olhar Brasil do Ministério da Cultura; projeto desenvolvido através de parceria com o Instituto de Artes do Pará – IAP.

Meu trabalho como preparadora de elenco antecedeu o período das gravações em pelo menos três meses e meio, visando às etapas de:
1) Formação de perfil das personagens (ação decisiva para nortear-me durante a etapa de preparação de elenco. Aqui eu fui tecendo as abordagens e estratégias que eu definiria para utilizar com os atores, a posteriori);
2) Seleção de casting;
3) Preparação de elenco, e
4) Direção de elenco.

Antecedendo a etapa de seleção de elenco, o roteiro final contendo todos os capítulos foi entregue aos núcleos da equipe EVA. Antes de tudo, meu trabalho consistiu em ler a “bíblia” do EVA FAZ DE CONTA para compreender o caminho psicológico das personagens, e em ler todos os capítulos da minissérie para consolidar o perfil das personagens. Essas ações me indicariam, a priori, as abordagens que eu utilizaria com os atores, tanto no momento da analise previa dos profissionais (seleção de casting), quanto na abordagem individual que eu faria durante a preparação do elenco.

Eu pensei: “se essa linha de raciocínio funciona comigo, abrindo caminho para minha descoberta e construção de personagem, deverá funcionar também com outros atores; afinal o parâmetro para meu trabalho como atriz, bem como instrutora e diretora, parte de mim mesma através de minhas próprias experiências, vivências e observações em busca de resultados satisfatórios e conclusivos para meu desenvolvimento como intérprete”. Resolvi arriscar confiando plenamente em minha intuição... o que funcionou mais do que eu esperava.

Após a escolha prévia dos atuantes para os devidos papéis da trama, aconteceram ainda pequenos laboratórios para consolidar de vez a certeza de que estes atores estariam cotados para os respectivos personagens descritos. Enfatizando que a personagem principal “Eva” (Cynthia Karina de Mendonça), não foi selecionada durante o casting, ela me foi indicada por um amigo-ator que a conhecia, pois nenhuma moça pré-selecionada atendia às exigências dos diretores. Cynthia foi-me apresentada, e neste mesmo momento tive o fealling de que ela funcionaria como protagonista, intuição que veio a se confirmar no primeiro laboratório e testes de câmera feitos com a menina.

Outra curiosidade aconteceu com o ator estreante Thiago Losant, (no papel de “Jorge”). Como eu já havia esboçado o perfil deste personagem, e comentado com um dos diretores do EVA (Ed Amanajás) e com a equipe responsável pelo casting, quando Thiago entrou na sala, todos nós paramos e o olhamos impressionadíssimos, pois Thiago era praticamente o próprio “Jorge”, tanto na aparência desenhada em nossa imaginação, quanto nos gestos característicos inerentes ao personagem. Não tive nenhuma dúvida! Ele já estava selecionado praticamente sem concorrentes, a encarnar “Jorge”.

O problema a solucionar em relação a Thiago é que ele estava totalmente cru para o vídeo, não sabia se portar diante da câmera. O ator já tinha experiência no teatro, mas para o vídeo, Thiago teve de ser bastante trabalhado. Utilizei inúmeras abordagens com ele durante o processo de preparação. Thiago aprendia e se desenvolvia satisfatoriamente. Na convivência, percebi que ele é um profissional centrado, dedicado, esforçado e bastante disciplinado; o que me agradou muito, pois gosto de lidar com atores conscientes de seu trabalho.

Os demais atores principais da trama Máximo Paganine e Gustavo Saraiva, os caminhos foram diferenciados também, pois Máximo era o mais novinho do elenco, com apenas dezesseis anos, e pouquíssima experiência como atuante, ele teria uma responsabilidade adicional: interpretar um rapaz tipicamente francês; aproveitei que o menino falava o idioma fluentemente, adequando o personagem ao ator, (personagem este que originalmente seria norte americano).

Gustavo Saraiva já era modelo fotográfico, de passarela e televisivo de longa data, ele já sabia se portar diante das câmeras, tive poucas interferências em sua atuação. Meu trabalho com Gustavo foi mais de interpretação das falas, sem grandes problemas. Gustavo já tinha o amadurecimento para ele mesmo propor ações relacionadas às suas falas e cenas com os demais personagens. Foi apenas um caminho de aparar arestas.

Em todo o processo de preparação de elenco, meu trabalho maior concentrou-se na protagonista, devido a mesma ser praticamente nula de experiências como atriz e em trabalhos de vídeo. Mas Cynthia é muito disponível e apta a apreender as indicações dadas. Houve alguns momentos difíceis, porém, através de seu esforço, dedicação e também disciplina, ela alcançou o resultado esperado, encantando a todos com sua postura profissional e madura no Set de gravações.

Durante os mini-relâmpagos-laboratórios onde expus e observei os atores, eu experimentei neles um indutor que comigo funciona muito, e de maneira extraordinária! Costumo utilizar músicas e/ou trilhas sonoras para me auxiliar a alcançar e desenvolver a “atmosfera” psicológica das minhas personagens. Com o pré-elenco do EVA estabeleci regras bem simples, utilizei um jogo de interfaces com os atores(atrizes) visando extrair e confirmar quem era quem dentro da trama.

Como a rigor eu já tinha relacionado algumas qualidades e características positivas e negativas nas personagens principais, extraí seis delas encontradas (três positivas e três negativas), recortei cada uma em separado, oferecendo-as em papeizinhos dobrados aos atores/atrizes; estes as escolhiam aleatoriamente. A única indicação que eu dava era para cada ator andar pelo espaço da sala ouvindo determinada música (previamente selecionada por mim), e para eles interiorizarem o que compreendiam sobre os adjetivos nos papéis dobrados e procurarem demonstrá-las para mim esboçando uma prévia partitura corporal (comportamental) e facial.

Alguns atores iam bem além do meu comando, já estabeleciam ações contendo diálogos imaginários improvisados. O que aconteceu, por exemplo, com ator Cesário Augusto. Percebi que ele foi fortemente influenciado pela trilha sonora e pelos adjetivos. Acredito que o ajudou muito, foi seu conhecimento e experiência nas Artes Cênicas já de longa data. Após isso, fui delineando com ele um tom de voz condizente com as ações encontradas em seu personagem (“Seu Caxias”). O tom de voz induzido para o ator, contribuiu para criar em torno do personagem uma atmosfera ameaçadora, opressora e até mesmo sádica.

Junto com esse jogo de interfaces, fui inspirada por um de meus diretores favoritos do cinema internacional. Wood Allen costuma deixar os atores muito à vontade e até mesmo ausentes de interferências indutoras diretas. Allen joga no ar as intenções e deixa que os próprios atores percebam as entrelinhas de maneira física e espontânea. Durante o laboratório utilizando música como indutora, procurei interferir o menos possível nesse mergulho dos atores. Deixando o caminho livre para a emersão das personagens.

Durante o processo de interpretação das falas (ainda preparação de elenco), experimentei nos atores algo que Walter (Bandeira) sonhava em concluir durante suas experimentações e descobertas dentro do Projeto de Pesquisa e Extensão “Resgate das Radionovelas”, onde ele coordenava os trabalhos pela Escola de Teatro e Dança da UFPA, idos de 2009...

Walter pretendia casar o indutor que ele denominou de “porão do subtexto”, tanto para interpretação para radioatores, quanto para interpretação de trabalhos em audiovisual. Walter era amante confesso da Sétima Arte, e esse seu amor norteou sua vontade de experimentar os resultados obtidos durante as pesquisas desse projeto de extensão para a interpretação também no vídeo. Em algumas reuniões inclusive, ele nos passava alguns filmes onde a gente podia perceber e discutir a importância e peso nas falas dos atores, onde as intensões veladas das falas para o trabalho de vídeo consistia em um aprofundamento e envolvimento psicológico maior junto ao espectador. Walter desejava que nós compreendêssemos isso e alcançássemos esse estágio enquanto intérpretes.

Entretanto, Walter Bandeira nos deixou sem sanar sua expectativa em relação ao prosseguimento das pesquisas. Eu como sua ex-aluna me propus a tentar concluir a vontade deste artista e pessoa maravilhosa. Meu mestre, que para mim foi uma imensa honra e privilégio ter conhecido, ter aprendido, trabalhado e ter dividido um pouco meus temores e dúvidas sobre a complicada arte da atuação.

Foi maravilhosa e decisiva minha convivência com Walter Bandeira durante o período em que eu fiz parte do grupo de alunos que estavam nesta pesquisa de extensão. Quem conheceu de perto Walter sabe que ele era contra o estrelismo e bajulações, era pessoa simples e muito humano e generoso. Entretanto, para mim, às vezes era meio constrangedor suas colocações, pois de uma maneira bastante informal e impactante ele nos ensinava nas entrelinhas... a irreverencia era sua marca maior, e inúmeras vezes ele literalmente me deixava sem chão, com sua maneira direta e não usual de se utilizar das palavras... Walter nos deixa muitas saudades e principalmente uma falta grande para o desenvolvimento do trabalho de intérprete em nosso estado do Pará.

Durante a preparação dos atores do EVA FAZ DE CONTA, eu percebi que as deduções de Walter estavam corretas. Se ele não pôde constatar de perto os resultados que ele supunha obter para o aprofundamento da interpretação para o vídeo mediante a utilização indutora do seu “porão do subtexto”, tive a oportunidade de experimentar com os atores Cynthia Karina de Mendonça, Thiago Losant, Máximo Paganine e Gustavo Saraiva que os resultados encontrados por Walter funcionam sim para o vídeo, e eu ainda vou além: tranquilamente deduzo que o “porão do subtexto” dinamiza até o trabalho de dublagem.

Estou muito serena e com a sensação do “dever cumprido” ao que me foi confiado executar. E grata pela oportunidade de experimentar e partilhar coisas que aprendi e também joguei para ver se davam certo. Acredito que o sucesso em qualquer empreitada sempre se deve ao esforço do raciocínio e também na autoconfiança naquilo que você se propõe a fazer. Foi muito divertido e uma aventura inesquecível! Finalizo aqui meu Diário de Bordo – EVA FAZ DE CONTA.

Katiuscia de Sá
04 de agosto de 2011.

*Outros registros sobre o EVA FAZ DE CONTA:

TEASER Eva Faz de Conta:

BLOG:
http://diarioportrasdascameras.blogspot.com/

*Sobre o Projeto de Pesquisa e Extensão RESGATE DAS RADIONOVELAS:


Entrevista sobre o curta paraense "O Forasteiro"


Há 4 anos desenvolvendo um trabalho importante em produções audiovisuais no Norte do país, o Núcleo de Produção Digital (NPD) de Belém, localizado no Instituto de Artes do Pará (IAP) ajudou a qualificar mais de 800 profissionais e desenvolveu um trabalho de incentivo em diversos projetos, como os curtas de ficção “Diário de Célia”, “Devorados”, o vídeoarte “Cromoverdose”, entre muitos outros.

Desde agosto o público interessado em concretizar seus projetos, tem a oportunidade de realizar produções de imagem e som e edição com equipamentos profissionais, cedidos pelo NPD Belém conforme o regulamento do Edital de Utilização dos equipamentos do Núcleo de Produção Digital / IAP lançado no Diário Oficial e disponível no site do IAP (www.iap.pa.gov.br).

O lançamento do Edital torna real a democratização da produção audiovisual da região Norte do país, dando chance ao público em geral de realizar projetos que sejam dos gêneros: documentário, ficção, clipe, vídeoarte, experimental e animação. As inscrições para uso dos equipamentos são gratuitas e a pauta disponível para uso do equipamento estará aberta até 20 de dezembro de 2011 e deverão ser feitas 15 dias antes do período solicitado.

Como primeira usuária beneficiada pelo edital, Katiuscia de Sá, diretora de curtas metragens, falou sobre a importância do Núcleo de Produção Digital do IAP para a produção local;

1-Qual a importância do edital do NPD para a comunidade em geral?

Eu acho muito importante a abertura de um edital assim, pois muita gente produz vídeo de forma independente aqui no Pará, e se você deseja experimentar algo diferente, fora da academia e se você quer explorar uma proposta de direção mais contemporânea ou até mesmo mais experimental, seja pela ousadia ou loucura do roteiro, você não consegue patrocínio, então uma ilha de edição completa como essa do NPD que você utiliza sem custos adicionais é um ponto importantíssimo para a conclusão do seu trabalho, é fantástico! Eu achei muito providencial esse edital, pois eu estou com esse meu material já faz mais de um ano para editá-lo, e com uma ilha de qualidade como essa do NPD onde você pode utilizar sem o aluguel (que para um projeto com pouca grana sairia oneroso caso fosse utilizar uma ilha de produtora), é muito bom sem duvida! Sem falar na parte institucional do apoio onde o NPD-Pa entra, o que também dá um peso maior para o seu filme.

2-Como ficou sabendo do edital de utilização?

Desde junho eu aguardo a publicação e sempre entrava em contato com Gallindo (gerente do núcleo), perguntando sobre como eu poderia utilizar essa ilha pra editar meu curta. Sabia da entrega desse material para o NPD desde o final do ano passado. Eu já tinha essa expectativa para utilizar esse espaço, mas ainda tinha a problemática de que há poucos profissionais capacitados a utilizar o programa profissional de edição de video (Final Cut) aqui em Belém, e a mão de obra que mexe com isso já está praticamente trabalhando nas TV’s e nas agencias de publicidade. Além do que, custear um profissional desse porte sai um pouco caro, considerando a trabalheira que é editar um vídeo, eu já acompanhei e é meio chatinho..., mas quem trabalha com isso, gosta! Então, sobre o edital: Galindo me explicou que haveria a abertura desse edital agora pelo inicio do segundo semestre de 2011, e ele me orientou da papelada e os tramites legais que habilitariam meu projeto para a utilização desse espaço. Eu vim muito aqui no NPD conversar com Galindo para finalizar meu curta, já atrás da abertura desse edital. Se você não correr atrás, as coisas não acontecem. (rs)

3-O que representa a NPD e seus equipamentos para a realização do seu trabalho?

Representa uns 70% da realização de meu trabalho. Pois é como lhe falei, se você está com um projeto independente, você já baixa o custo mais da metade com o empréstimo do equipamento de filmagem e a utilização da ilha de edição, que é o meu caso, estou habilitada para a utilização da ilha para a captura, edição e finalização de meu curta. Futuramente pretendo pedir o kit do equipamento de filmagem, mas é um projeto mais adiante...

4-Como está o mercado de audio visual no Pará?

Olha, o mercado existe. Mas está meio tímido. Há muita gente talentosa, gente séria, com potencial e vontade de realizar seus trabalhos, mas o que impede são os custos dessa realização, e também a falta de patrocínio de empresas que acreditem nesse formato de arte como retorno para seus empreendimentos. Existe também a falta de politicas públicas estaduais mais eficientes para incentivar e bancar essas realizações. Já temos um ganho esse ano com a abertura do curso superior de Cinema na UFPA, que vai forçar uma mobilidade no mercado de áudio visual em Belém, eu acho..., acredito que isso irá redimensionar a configuração das realizações em vídeo na cidade, abrindo novas possibilidades de diálogo entre realizadores, produtoras e empresas particulares dispostas a apostarem nesse formato de mídia como retorno para seus investimentos. E também um ganho maior, sem duvida, a vinda de Galindo a frente do NPD, já acompanho a militância dele em favor do audiovisual no estado há um bom tempo, e Gallindo é muito competente e PERSISTENTE nas coisas: ele vai, corre atrás, vira e mexe e faz as coisas acontecerem. Acho a presença dele fundamental a frente do NPD nesta nova gestão! Espero que continue essa abertura, onde o áudio visual do estado ganha muito.

5- O segmento do audio visual conhece o trabalho do IAP? De que forma? Como é visto?

Acredito que sim... pois já desde meados de 2009 o NPD vem realizando inúmeras oficinas capacitando pessoas ligadas ao audiovisual de Belém com instrutores renomados (diretores, produtores, roteiristas, etc), e isso vem contribuindo para a qualificação e aprimoramento de pessoas que por algum motivo não podem sair do estado em busca desse aprimoramento. Eu me lembro, acho que eu frequentei quase todas essas oficinas, inclusive participando do projeto EVA FAZ DE CONTA, que foi pelo NPD ano passado, onde os melhores alunos de todas essas oficinas estavam na equipe dessa produção. Esse acontecimento foi fundamental para nossa formação, pois experimentamos na real como uma produção cinematográfica funciona, como é o trabalho em um Set de filmagem, experimentamos todas as problemáticas e tivemos a chance de solucioná-las, foi como se fosse nosso teste final, digamos assim, depois de termos passados por todas as oficinas em audiovisual oferecidas pelo NPD, nos capacitando para o mercado profissional. Realmente foi uma oportunidade excelente! Sou muito grata.



Sua Esposa e o Mundo


Um filme aparentemente monótono, cujo desenrolar da estória vai eliminando das cadeiras de cinema um a um, o espectador preguiçoso e não habituado a diálogos enormes, vulgares e chafurdados do ideal norte-americano apresentados de maneira inteligente. Com a temática principal puramente politica, a obra “Sua Esposa e o Mundo” (State of the Union) de Frank Capra, oferece e vende seu peixe sem qualquer cerimonia. Repleto de pequenas tiradas de humor ingênuo, e de falas vulgares onde toda caipirice dos primórdios da sociedade norte-americana despenca e segue reconfigurando o cavalgar da narrativa a cada momento.

A obra-prima do cinema clássico melodramático, espetaculoso em toda sua forma, nos trás a vida dos bastidores da politica norte-americana. Um magnata da indústria aeronáutica é escolhido pela fatia detentora do Quarto Poder para ser um possível candidato à presidência da república. O indicado, porém, serve de joguete entre a paixão de duas mulheres: “Mary Matthews” (Katharine Hepburn), arquétipo mais do que batido e idiotizado da mulher-pura-esposa-do-lar; no outro extremo da corda “Kay Thorndyke” (Angela Lansbury) – a rara exceção figurativa para aquela época – da mulher poderosa-inteligente-fria-calculista de personalidade contida e avassaladoramente forte, que usa suas capacidades mentais em prol de seus interesses e ideais; e a corda entre as duas mulheres, literalmente representada pelo empresário ambíguo “Grant Matthews” (Spencer Tracy), também o arquétipo do homem esperto que venceu na vida oscilando na balança valores éticos e outros subversivos, que na verdade não passa de um joguete testa-de-ferro dos interesses velados de todos que o ajudam na sua candidatura.

Esta produção de 1948 é um exemplo bem claro e direto do que foi e ainda é a politica do País “dono do mundo”. Cenas de acordos partidários e encenações comportamentais mostradas e plantadas pela mídia televisiva e impressa dão um sabor todo especial aos takes. Em contrapartida, em outra camada abordada pelo filme observa-se veladamente a perpetuação dos valores morais e dos bons costumes cristãos dos “bem-nascidos”: os pobres pobres e sem voz, e os ricos ricos sem escrúpulos articulando-se em comunas reuniões sociais de bebedeira, comilança e ostentação cujo teor da conversa é sempre a mesma: poder! O clássico aspecto maniqueísta tão comum em Frank Capra.

Para dar uma pequena virada na monotonia dos imensos diálogos-ideológicos, Capra se utiliza de um bom jogo. Dispõe de uma competição aérea entre alguns aviadores e a comitiva de “Grant Matthews”, ambas aeronaves estão milagrosamente lado a lado nos céus. “Grant” é levado a um desafio. Particularmente foi a parte do filme que eu mais gostei, entretanto, até mesmo essa competição aérea aparece como representatividade da corrida pelo poder, nada mais brilhante do que utilizar a espetacularidade de um jogo entre aviões (o poderio bélico veladamente manipulado através de uma suposta brincadeira), artificio visual utilizado para ressaltar a grandiosidade corrida pela presidência da republica dos Estados Unidos entre o partido dos Democratas e Republicanos.

“Sua Esposa e o Mundo” ainda deixa escapar um ar da estratégia punk, as próprias ferramentas utilizadas pelos que governam para perpetuar o status quo é utilizada pelo protagonista visando denunciá-la. Todo o circo armado na casa dos Matthews aparece como uma oportunidade de denuncia (ou não, dependendo do grau de compreensão, informação e nível de engajamento do espectador sobre questões de politicagem internacional e história das nações). No mais surrado final feliz, estilo “o Bem vence o Mal”, até que se prove o contrário... o filme serve de consolo. Mediante as temáticas e recursos de cena utilizados, os filmes de Frank Capra não são para qualquer espectador, entretanto o publico comum com um pouco de boa vontade e paciência pode abstrair o óbvio de suas obras.


Katiuscia de Sá
27 de outubro de 2011
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“Sua Esposa e o Mundo”
- FICHA TÉCNICA -

Título Original: State of the Union
Ano: 1948
País: EUA
Gênero: Comédia Drama
Duração: 124min
Direção e Produção: Frank Capra
Roteiro: Howard Lindsay e Russel Crouse
Fotografia: George J. Folsey
Música: Victor Young
Elenco:
Spencer Tracy --- Grant Matthews
Katharine Hepburn --- Mary Matthews
Van Johnson --- 'Spike' McManus
Angela Lansbury --- Kay Thorndyke
Adolphe Menjou --- Jim Conover
Lewis Stone --- Sam Thorndyke
Howard Smith --- Sam I. Parrish
Charles Dingle --- Bill Nolard Hardy
Maidel Turner --- Lulubelle Alexander
Raymond Walburn --- Judge Alexander
Margaret Hamilton --- Norah
Art Baker --- Leith - Radio Announcer
Pierre Watkin --- Senator Ed Lauterback
Florence Auer --- Grace Orval Draper
Irving Bacon --- Buck Swanson


REGISTRO UM: direção

*Esse texto é referente à minha primeira experiência valendo como Diretora Cinematográfica.


Então, durante a trajetória do curta-metragem digital O Forasteiro, eu fui fazendo o filme de modo intuitivo, porém não às cegas. A adaptação do roteiro de um texto literário (de minha autoria) foi feito ainda sem eu ter total compreensão da linguagem especifica para roteiro de cinema, que é composto de suas formas, nomenclaturas e linguagens especificas para o suporte do cinema. Mas como um primeiro trabalho valendo, O Forasteiro serviu para eu perceber minhas potencialidades e também me harmonizar com esse novo suporte artístico que eu experimentava. A vivência serviu para eu aprender fazendo, experimentando, brincando, me divertindo. Uma coisa que compreendi é que fazer cinema é prazeroso, pois é quase como uma brincadeira de faz de contas, de nossa época de criança. Porém, uma brincadeira com regras, responsabilidade, organização e ação programada...

Por exemplo, eu esbocei algo muito superficial acerca do que denominam de “roteiro técnico”. Que na verdade tratava-se mais de um pequeno roteiro de ações pra mim mesma, posto que cumulativamente eu assinava o roteiro, Direção Cinematográfica e Direção de Fotografia, de modo que as indicações que eu dei ao cinegrafista foram mais sobre as minhas escolhas de enquadramento e ângulos a serem utilizados, não fiz algo em conjunto com o cinegrafista (que também assina a assistência de fotografia). Lembro-me que inúmeras vezes eu visitava as locações onde aconteceriam as filmagens, e me comportava como se meu olhar fosse a câmera enquadrando os pontos que eu queria. Não anotava nada, registrava tudo na memória fotográfica, e depois repassava ao cinegrafista.

Levei o operador de câmera em algumas dessas visitas, e expliquei-lhe meus objetivos, ele compreendeu bem, e também sugeriu alguns ângulos e enquadramentos. Confesso que fui receptiva (às vezes) mais aos ângulos do que aos enquadramentos propostos, pois eu estava sempre ao lado dele tal um “papagaio de pirata”, muito decidida em relação aos enquadramentos, para mim o equilíbrio entre os elementos na tela era fundamental para a estética do filme.

O que me ajudou muito mesmo foi meu conhecimento na área das Artes Plásticas (sempre desenhei e compus quadros), isso me ajudou a alcançar esse equilíbrio estético na composição do enquadramento, esse comportamento estendeu-se também para os campos da Direção de Arte e Cenografia quando expliquei as minhas intenções a quem assinou a Direção de Arte (Verônica Lima), ela compreendeu muito bem as intenções do filme, então criou o ambiente correspondente com muita eficácia.

Em relação a essa parte de criação, ainda nesse meu primeiro trabalho eu obedeci mais às minhas ansiedades do que a uma leitura coletiva da obra. Cedi mais à intensão de mexer no desfecho da trama, proposta pelo ator do filme (Thiago Losant), onde achei interessante o final inventado por ele.

No processo todo d’O Forasteiro, ficou muito nítido essa relação de “dirigir”, papel do Diretor Cinematográfico, ao mesmo tempo em que seu olhar deve ser macro, sua sensibilidade instantaneamente deve-se dedicar-se também ao micro, onde ele empresta seus talentos aos demais profissionais das diversas áreas, dando-lhes as indicações para que estes dialoguem com a obra, propondo sua visão especifica sobre o roteiro.

E para isso acontecer em satisfação de ambas as partes, o Diretor, sabiamente esboça as linhas gerais de sua ideia de realização do roteiro, e os profissionais dos departamentos irão recriá-lo conforme suas perspectivas. Sempre sabedores de que a essência do roteiro deve estar lá acima de qualquer preferencia pessoal. O Diretor deve deixar margem para a criação individual das pessoas que compõem os departamentos, desse modo eles também farão parte da obra. Compreendi isso um ano e meio depois desse processo. E pretendo pôr em pratica para meus próximos trabalhos, posto que o amadurecimento de um Diretor Cinematográfico renderá à sua obra a maior proximidade com a essência do filme que ele quer mostrar, ou seja, maior qualidade.

Acredito que a cada obra o cineasta aprende um pouco mais sobre essa engrenagem de fazer filmes. A “ferramenta” é comum e ao alcance de qualquer pessoa que deseja fazer filme, porém percebi que a “linguagem” e “abordagens” são mais profundas e refinadas. Para dinamizá-las ao Diretor exigem-se muitos conhecimentos de diversas áreas para que ele possa alcançar de fato, a harmonia entre forma e conteúdo cinematográfico. É um dialogo sussurrado pela obra de arte cinema, daí a dilatação do Diretor de suas capacidades perceptivas e de releitura das coisas, para traduzi-lo satisfatoriamente para este suporte.

Meu próximo registro será sobre roteiro. Espero em breve ter vontade para escrever e postar. Para quem quiser saber sobre os bastidores do curta mencionado, visite:


Katiuscia de Sá
28 de dezembro de 2011